Paula fala sobre o programa, o impacto da floresta amazônica e as viagens para desvendar as riquezas naturais do Brasil. Conta as situações inusitadas que enfrentou como os inúmeros pousos forçados, as turbulências, as picadas de diferentes espécies de insetos e já precisou deixar uma cidade sob a escolta de policiais.
Paula Saldanha é também autora e ilustradora de livros. Trabalha como editora de texto, repórter e apresentadora de televisão há trinta anos. Há dezesseis se dedica às produções próprias e independentes. Elabora suas pautas pensando nas novas e futuras gerações, sempre com o intuito de informar.
Em 1972, Paula Saldanha e o biólogo Roberto Werneck tinham uma meta: ir á busca da nascente do Rio Amazonas, o maior rio do mundo. “A gente nem pensava em fazer televisão ainda”, comenta. Esse foi o elo, o eixo, para todo o trabalho realizado até hoje.
Paralelamente ao projeto Expedições - série que é co-produzida com a TV Brasil - Paula faz a catalogação do acervo que reuniu ao longo dos anos. Em sua produtora, no Rio de Janeiro, são produzidos DVDs trilíngues - em português, inglês e espanhol - com imagens da natureza brasileira e sua diversidade, que completam uma coletânea que leva o mesmo nome do programa, e estão disponíveis em Centros Culturais do Itamaraty em 150 países.
Confira a entrevista:
TV Brasil: Como surgiu a série Expedições?
Paula Saldanha: Em 1972, eu nem pensava em fazer televisão ainda. Eu e Roberto Werneck, biólogo - na época era só biólogo, agora é também documentarista – começamos a nossa vida a dois com uma primeira pauta: ir á busca da nascente do Rio Amazonas. Ele é meu companheiro de vida, de trabalho e temos 3 filhos. Fizemos o resumo de todos aqueles que buscaram as origens do maior rio do mundo, mas não tínhamos a idéia de como isso seria documentado. Em 1974, quando me convidaram pra fazer televisão e apresentar o Fantástico, nós começamos a planejar a compra dos nossos equipamentos naquele formato de documentário, que o Roberto criou em 1977. Ele saia por várias regiões brasileiras, Amazônia, Pantanal, com uma câmera 16 mm, película! Nas costas, e ia sempre com dois assistentes. Aquele formato deu origem ao primeiro programa de meio ambiente para crianças e jovens, que foi o Globinho Repórter, e naquele mesmo formato.
Expedições começou a ser gerado aí?
Sim, foi o embrião do “Expedições” de hoje. Nós fizemos durante muito tempo reportagens especiais para o Fantástico, sempre nessa linha de meio ambiente. E, em 1994, quando eu já não era mais funcionária de uma grande emissora, criamos coragem para sair em busca da nascente do Amazonas. Pelas pesquisas que nós tínhamos era bem ao sul do Peru, e não no norte. Portanto, tornando o Amazonas maior que o Nilo. Ainda estamos nessa de concertar os livros de geografia e os mapas. E Nascente do Amazonas, o documentário, deu origem a série Expedições. Foi exibido na antiga Manchete, documentário que teve um sucesso estrondoso, gerou livros e filmes e deu origem a série Expedições, que está há 15 anos no ar. Esse foi o início. Era um documentário por mês de uma hora. Hoje, nós fazemos 4 ou 5 documentários por mês. Um por semana, de 25 min.
Quanto tempo levou a viagem para as gravações de Origens da Amazônia?
Durou um mês e alguns dias, em território Peruano e pela Amazônia peruana. Nós tivemos que pular um trecho da parte mais acidentada do Rio Apurimac Cyanide. Então nós voamos direto para Cusco, Machu Picchu e, depois, começamos a seguir o curso do Apurimac. Fomos a primeira equipe a documentar a primeira nascente do maior rio do mundo para a televisão. Imagens em movimento. Antes, em 71, o Loren McIntyre tinha ido pela Revista National Geographic para fazer essa documentação com fotos. Nós não sabíamos. As nossas pesquisas eram todas feitas no Peru, em um Instituto geográfico de lá. E depois tornamos grandes amigos do Loren, que é homenageado nesse programa. Foi e é, até hoje, um trabalho apaixonante.
Depois de anos, vocês reuniram um rico e farto material sobre o Brasil e suas fronteiras...
Só os documentários disponíveis do “Expedições”, no site, agora, são cerca de 300, nesse formato. Agora, os disponíveis. São milhares de reportagens, não tem como contabilizar quantas horas de imagem em movimento. Daria para dar a volta ao mundo. Mas, o curioso é que as pessoas nos procuram e estamos sempre em algum canto, alguma fronteira, longe. Nós achamos que depois de um certo tempo, não vamos agüentar, não. É verdade que agora já temos mais duas equipes para dar conta das gravações em áreas de difícil acesso. Sem precisar que eu e Roberto precisemos estar lá, em todas as matérias, todos os dias da semana.
Qual o lugar que Expedições ainda não foi, mas, precisa ir?
É gozado. Imagine o Brasil com catapora. Todo pintadinho. A gente esteve documentando o Brasil assim. Imagine ele cheio, todo pintado. Nós fomos a diversas regiões. Documentamos, por exemplo, o índio Ianomâmi no território Ianomâmi, em Roraima, via Amazonas e toda essa região de fronteira. Mas não estivemos mais para o oeste, na região da Cabeça do Cachorro. É uma região que tem uma concentração muito grande de etnias. Eu estava planejando um livro sobre etnias dos índios da Amazônia, mas eu não posso terminar esse livro se eu não for pra lá. Fica no extremo noroeste da Amazônia Brasileira. Já fomos mais pra baixo, Biriri, Mamirauá, Tabatinga, na fronteira, ficamos do lado peruano; subimos todo o Rio Jaguari, que é exatamente aquela curvinha do Acre. E, sem saber, estávamos pertinho do Rio Caiari, que é próprio Rio Amazonas. Eu nunca fui também ao extremo oeste que é o Parque Nacional da Serra do Divisor. Mas, já estive pertinho como daqui aí. Só que eu precisava de um helicóptero para fazer as imagens éreas e deixei para outra ocasião. No Brasil, só restam esses dois pedacinhos de fronteira.
O que você viu de mais belo?
É difícil selecionar uma coisa mais bela, já que temos a maior área de regiões naturais, sem muita interferência do homem, fora a tundra, nos pólos, o Brasil tem essas grandes áreas naturais e essa mega diversidade. Se for falar de exuberância de floresta, rio, essa malha de rios, a Amazônia brasileira foi o que mais me emocionou. É uma coisa que impacta quando vista de cima, pela primeira vez. Na época da cheia é o planeta d'água. Durante a seca, rios azuis em tapetes de florestas verdes. E temos o litoral que é espetacular, que já fizemos várias vezes de helicóptero ou por via terrestre. Da ponta da Baía do Oiapoque, no Cabo Orange, até o Arroio Chuí, a gente fez tudo de helicóptero e de baixo, por via terrestre. Agora, estamos refazendo algumas regiões. O mar de Noronha, as praias do nordeste... Modéstia a parte, o Rio de Janeiro que é o lugar mais bonito do mundo. Conjunto que mistura mar, floresta, montanhas, praias maravilhosas, o desenho das montanhas, baias e lagoas, e que não pode continuar sendo maltratado. Ainda temos o Pantanal, que é exuberância de vida animal; a caatinga, o sertão nordestino e toda uma cultura popular única. E tem os Pampas Gaúchos... Fica difícil separar uma coisa mais bonita. Cada um é belo na sua diversidade. O barroco mineiro... A mistura étnica e cultural, as várias influências. Realmente estamos bem servidos em termos naturais, étnicos e culturais.
Quais são os maiores desafios?
As expedições são o alimento de todo esse trabalho. A gente faz acervo sobre o Brasil de modo muito bem pensado, planejado, e bem cuidado. Ficamos pendurados em porta de helicóptero, carregamos muitos equipamentos e levamos outras pessoas... A pesquisa prévia é muito intensa e sistemática. Eu não tenho conhecimento de um trabalho do gênero. Fazemos isso há 32 anos. Quando começou uma inundação de produto estrangeiro da National Geographic, da Discovery, o material começou a chegar muito barato e inviabilizou uma produção independente. O que foi proposto para pagamento não viabilizava nem as passagens aéreas. Então resolvemos passar para o status “Independentíssimo”. E, no segundo semestre de 2009, nós fizemos o nosso primeiro contrato de co-produção. Foi com a TV Brasil.
Quais os momentos de mais perigo?
Uma das poucas vezes em que eu senti muito, muito medo, quase pânico, foi num pouso forçado em uma BR. Estávamos com o Pedro (filho de Paula e Roberto), o avião estava indo para Xapuri, no Acre, e pegou um CB muito forte. Entre as nuvens e a floresta, o piloto conseguiu sair pela janela e quando voltou à pista, não era pista, era um lago. Ou seja, ele não tinha como aterrissar. O combustível começou a acabar, e ele então, desceu na BR que liga a Xapuri. Outra vez, estávamos em Poconé, documentando os garimpos, numa região aonde a água vem toda para os rios do Pantanal. E vem também o mercúrio. Estávamos querendo entrevistar uma juíza que tinha liberado o garimpo lá. De repente fomos literalmente cercados, pois me confundiram com uma repórter local que estava jurada de morte. Teve que vir batalhão de choque escolta policial até ao aeroporto. Tem de tudo. Tivemos que fazer diversos pousos forçados que já perdi a conta. Fonte: TV Brasil – Rio de Janeiro/RJ