Na esquerda, briga pelos
votos do ex-presidente já começou; candidatos mais ao centro e até mesmo à
direita podem ser beneficiados
Com Lula preso e fora do
páreo, o cenário para as eleições deste ano fica extremamente fragmentado. A
avaliação é de Leonardo Barreto, doutor em Ciência Política pela Universidade
de Brasília (UnB). De acordo com o analista, a prisão do ex-presidente deve dar
fôlego a candidaturas que antes não viam espaço para crescer.
“A saída do presidente
Lula retira um vetor de polarização do processo eleitoral. Então, você vai ter
uma pulverização de candidaturas, um número maior de candidaturas que passa a
acreditar que possa ter algum tipo de viabilidade política”.
Leonardo Barreto considera
que, entre os partidos de esquerda, a briga pela herança eleitoral de Lula já
começou. Ele destaca quatro nomes na disputa pelo voto “lulista”.
“À esquerda, você vai ter
vários partidos brigando pelo espólio eleitoral do Lula. Eu acho que Manuela
d'Ávila e Guilherme Boulos, do PC do B e do Psol, foram ungidos como herdeiros
do Lula, mas você também tem, acho que mais duas outras opções, que são Joaquim
Barbosa, que se filiou ao PSB, que ainda tem que viabilizar sua candidatura,
mas está colocado, e Ciro Gomes (PDT)”.
Leonado Barreto destaca
que Ciro Gomes não esteve presente nos atos em defesa de Lula, no Sindicato dos
Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo. Segundo ele, o ex-governador do
Ceará, que postou nota defendendo Lula, pode estar buscando um eleitorado mais
moderado.
“Nesse aspecto chama muito
a atenção o fato de Ciro Gomes não estar presente no palanque do Lula. Ele,
então, de repente vai trabalhar uma posição mais moderada e aí então fez
questão de ter algum distanciamento de Lula naquele momento”.
Para o cientista político,
o voto de Lula não está exclusivamente condicionado a eleitores de esquerda.
Segundo ele, nomes como Geraldo Alckmin (PSDB) e Jair Bolsonaro (PSL) também
podem ser beneficiados pelo vazio eleitoral deixado pelo ex-presidente.
“Você vai ter, talvez,
eleitores do Lula mais ao centro que podem caminhar para uma candidatura, por
exemplo, como Geraldo Alckmin, que sinalizou que vai ser ortodoxo, liberal na
economia, mas que manterá a direção progressista nos valores. Você tem um voto que
pode ir para o Bolsonaro, sim, que é um voto de natureza mais populista, mas
também tem um voto antissistema. Eu acho que você vai ter muitos eleitores do
Lula que vão dizer assim: ‘olha, se eu não puder votar no Lula, então eu vou
sabotar o sistema’. E você vai ter o pessoal que vai tentar manter a coerência
em termos de política econômica. ‘Não, eu quero votar em um candidato que tem
orientação econômica de esquerda’”.
Na última pesquisa
Datafolha, divulgada em Janeiro, o deputado Jair Bolsonaro liderava o cenário,
com 20% das intenções de voto, tecnicamente empatado com Marina Silva (REDE),
que pontuou 16%. A ex-senadora, de acordo com Barreto, também pode se
beneficiar com a saída de Lula da eleição. No entanto, o especialista aponta
para as dificuldades da pré-candidata, desgastada por duas eleições
consecutivas.
“Há um ceticismo muito
grande em relação à Marina por um desgaste acumulado durante as campanhas
anteriores. A Marina nunca conseguiu se posicionar à esquerda ou à direita,
mesmo ela defendendo que essas categorias de posicionamento não são
importantes. Mas o fato é que ela acabou ficando sem identidade e isso cobra um
preço, sempre cobrou”.
Leonardo Barreto destaca
que a análise é momentânea, já que as eleições ainda estão distantes e muita
coisa pode acontecer. O PT, por exemplo, pode tentar registrar a candidatura de
Lula, mesmo que o político esteja preso. A investida pode ser uma alternativa
para ganhar tempo, aproveitando o espólio eleitoral de Lula, enquanto o
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) analisa o pedido do partido. A solicitação,
no entanto, deve ser negada, uma vez que o petista foi condenado em segunda
instância e por isso esbarra na Lei da Ficha Limpa.
Preso desde o último
sábado, o ex-presidente teve, em janeiro, a condenação dada pelo juiz Sérgio
Moro em primeiro grau confirmada pela 8ª turma do Tribunal Regional Federal da
4ª Região (TRF-4), em Porto Alegre. Na ocasião, os desembargadores aumentaram a
pena de Lula: de nove anos e meio para 12 anos e um mês de prisão.
Por João Paulo Machado
Agência do Rádio