“Seja o nosso Dirceu”, foi o recado recebido por Francisco Justino no Presídio Regional de Cajazeiras, levado pela filha, Dataniele Ferreira. O autor da “ameaça” foi o prefeito de Marizópolis, Zé Vieira, citado na denúncia protocolada pelo procurador da República, Tiago Rafael, que resultou na prisão dos empresários Mário Messias e José Hélio em nova etapa da Operação Andaime, desencadeada em conjunto por Polícia Federal, Controladoria Geral da União (CGU) e Procuradoria da República.
Francisco Justino era o operador do suposto esquema criminoso e firmou acordo de delação premiada com a Procuradoria da República. O recado de Vieira foi entregue à filha do delator durante reunião com o empresário Mário Messias, que enviou por ela um bilhete manuscrito com orientações para Justino, bem como pedido de informações sobre como proceder a operação criminosa junto às prefeituras. Ao todo, 16 municípios seriam os alvos da investigação.
No bilhete, em específico, aparecem Monte Horebe, com a prefeita Cláudia Aparecida (a mesma afastada recentemente pela Justiça) sendo citada, e Vieirópolis. Além delas, na fase inicial da operação, foram citadas Cajazeiras, Cachoeira dos Índios, Joca Claudino e Bernardino Batista. A investigação corre em segredo de Justiça. Ficou claro para os investigadores que, soltos, Mário Messias e José Hélio deram continuidade ao esquema criminoso e também agiram para intimidar outros envolvidos.
Em delação premiada, Justino revelou que recebeu em setembro a visita de “Ronaldo da RM e Jaiminho” em casa. Eles foram enviados por Mário Messias para cobrar o valor de uma Hylux apreendida durante a primeira fase da operação. “Ronaldo perguntou a Justino se ele ‘não estava com medo de morrer’ por ter feito a delação premiada e ‘mexer com gente grande'”, diz a denúncia protocolada na Justiça para pedir a prisão de Mário Messias.
O esquema funcionava, segundo as investigações, com o uso de empresas fantasmas que venciam os processos licitatórios, mas quem executava o trabalho era a empresa de Mário Messias, geralmente com processos superfaturados. A referência de Zé Vieira a Dirceu foi pelo fato de o ex-ministro José Dirceu ter sido preso no Mensalão e na operação Lava-Jato e não ter delatado ninguém.
Análise da Primeira Parte do Bilhete de Marinho
Por conter mensagens parcialmente cifradas, o bilhete elaborado por “Marinho” para ser entregue a Francisco Justino do Nascimento precisa ser dividido em três partes para melhor compreensão.
Trata-se de pedido de “Marinho” para que Francisco Justino entre com requerimento com o objetivo de retornar o serviço de coleta de lixo no Município de Monte Horebe, tendo em vista o retorno da Prefeita Cláudia ao cargo. Efetivamente, Cláudia Aparecida Dias foi afastada do cargo de Prefeito de Monte Horebe por decisão do Tribunal de Justiça da Paraíba na data de 21 de julho de 2015, em ação cautelar penal apresentada pelo Grupo de Combate ao Crime Organizado – GAECO do Ministério Público da Paraíba, no âmbito da “Operação Monte Sinai”, conforme notícia de fl. 50/51, autos apensados, e imagem a seguir
Análise da Segunda Parte do Bilhete de Marinho
As quadras a que ele se refere são aquelas obras de engenharia (quadras escolares cobertas) vencidas formalmente pela Construtora Servcon de Francisco Justino nas licitações Tomada de Preços n. 08/2014 e Tomada de Preços n. 05/2014 (fls. 72/74, apenso), mas executadas efetivamente por Mário Messias Filho e José Hélio Farias. No bilhete, “Marinho” indaga a Justino quem procurar para resolver a questão do cancelamento das obras das quadras, pois intentava saber como receberia o dinheiro relativo à próxima medição (fl. 10, vídeo 17175949). Efetivamente, conforme declarações do réu colaborador à fl. 10, vídeo 17175949, as obras vencidas pela Servcon em Vieirópolis eram executadas por “Marinho” e Hélio, repetindo o padrão de execução já verificado na cidade de Cajazeiras e denunciado, em minúcias, nos autos da Ação Penal n. 000478-39.2015.4.05.8202.
Análise da Terceira Parte do Bilhete de Marinho
Major Sales é cidade do estado do Rio Grande do Norte, fronteira com a Paraíba, onde a empresa Servcon também venceu fraudulentamente diversas licitações para possibilitar a execução da obra por Mário Messias Filho e José Hélio de Farias. No caso do bilhete, “Marinho” informa a Justino que havia entrado cerca de R$ 80.000,00 para construção de uma Unidade Básica de Saúde e pergunta quem é o funcionário público que participa do esquema criminoso (Prefeito ou Secretário de Finanças), bem como quem emitiria a fatura, ou seja, as notas fiscais frias (fl. 10, vídeo 17175949). Esse caso de Major Sales é sintomático pois o valor exato de R$ 81.600,00 (oitenta e um mil e seiscentos reais) foi depositado pelo Fundo Nacional de Saúde na conta do Fundo Municipal de Saúde (CC n. 25.540-8, ag. 1165-7) em 11 de agosto de 2015, extrato de fl. 46, apenso, encaminhado pelo Banco do Brasil. Conforme esclarecido pelo réu colaborador (fl. 06, apenso), a construção da Unidade Básica de Saúde em Major Sales não havia sido sequer licitada e Mário Messias Filho já estava se articulando para sacar o valor. E mais: logo após sua liberação da prisão. Sempre que fraudada a licitação e iniciada as obras em Major Sales, elas eram executadas por “Marinho” e José Hélio.