SOCIEDADE - Os oito anos de governo do presidente
Luiz Inácio Lula da Silva trouxeram avanços para a questão racial, na
opinião do movimento negro, mas alguns
resultados poderiam ser melhores tendo em vista as expectativas geradas
com a chegada do primeiro trabalhador à Presidência da República.
“De fato existia uma expectativa da população negra com a eleição do Lula”, afirma Vanda Pinedo, coordenadora nacional do Movimento Negro
Unificado (MNU) ao manifestar frustração com a recente aprovação do
Estatuto da Igualdade Racial e com o desempenho da titulação de terras
quilombolas. “O estatuto traz o que traz a Constituição. Nós precisamos
de desdobramento para que, de fato, a política aconteça”, assinala.
Ela cita, entre os exemplos de políticas que deveriam receber mais
incentivo, a titulação de terras quilombolas. “Uma das maiores
políticas que poderia ser desenvolvida no governo Lula é a questão da
terra, porque terra é dignidade, poder, visibilidade, autonomia, renda,
cultura e respeito aos ancestrais. A terra tem todo esse conteúdo para
o povo negro do Brasil”, afirma. Segundo dados da Presidência da
República, 126 comunidades ganharam o título de suas terras desde 2003,
menos de 10% das 1.527 certificadas pela Fundação Palmares como áreas
quilombolas.
Vanda Pinedo reconhece que o governo lidou com “uma demanda de 500 anos” e que é difícil “dar conta de tudo em apenas oito”. De acordo com
ela, além das demandas históricas, o governo teve de enfrentar
resistência de alguns grupos de interesse, como é o caso, por exemplo,
da ação que o partido Democratas (DEM) move no Supremo Tribunal Federal
(STF) contra o decreto do governo que regulamenta a titulação de
terras quilombolas.
Além dessa ação, o partido de oposição é autor de mais duas no STF,
contrárias aos interesses do movimento negro: uma contra a política de
cotas raciais na Universidade de Brasília (UnB) e outra contra as cotas
do Programa Universidade para Todos (ProUni), que financia estudantes
nas faculdades privadas. Segundo balanço do governo Lula, 38
universidades públicas federais e 32 universidades públicas estaduais
têm programas de cotas.
Para José Antônio Santos da Silva, da organização não governamental
União de Negros pela Igualdade (Unegro), a resistência às políticas
afirmativas e de inclusão são ligadas ao preconceito racial. “O racismo sempre existiu. Ele sempre foi uma questão mascarada pela elite brasileira. ‘Eu tenho amigos negros, mas não aceito que um negro sente
num banco de universidade comigo’, isso não é racismo?”, pergunta. “O
que precisa olhar é que com o processo de titulação de terra das
comunidades quilombolas vamos dar oportunidade para que essa população
negra e pobre, que trabalha na agricultura, acesse o auxílio financiado
pelo orçamento público. E é isso que as elites brasileiras não
querem”, afirma.
Na avaliação do ativista, o governo Lula alcançou 30% das demandas
do movimento negro. “Para quem nunca teve um avanço positivo nas
políticas afirmativas, é algo satisfatório.” Ele espera que o governo da presidenta eleita, Dilma Rousseff, ouça “as bases” do movimento.
Para que os negros tenham mais espaço, Vanda Pinedo recomenda a
articulação política e a mobilização do movimento. “Penso que vai ser
um governo de bastante mobilização social e de bastante disputa”,
prevê.