segunda-feira, 19 de agosto de 2024

MPE recorre ao TRE-PB sobre decisão que deferiu pedido de registro de candidatura de Chico Mende (PSB)

O Ministério Público Eleitoral vem, por intermédio da Promotora Eleitoral que abaixo subscreve, respeitosamente à presença de Vossa Excelência, inconformado com os termos da r. Sentença de ID nº 122495857, interpor, tempestivamente, RECURSO ELEITORAL, pelas razões adiante descritas.

Requer, para tanto, que seja procedido o regular processamento ao Recurso, com a sua admissão e posterior remessa dos autos à Corte ‘ad quem’.

RAZÕES RECURSAIS

PROCESSO Nº: 06000080-39.2024.6.15.0068.

RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL

RECORRIDO: FRANCISCO MENDES CAMPOS


COLENDO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DA PARAÍBA

ÍNCLITO DESEMBARGADOR RELATOR


I – BREVE HISTÓRICO PROCESSUAL

O candidato Francisco Mendes Campos apresentou registro de candidatura na 68ª Zona Eleitoral da Paraíba para concorrer ao cargo de Prefeito do Município de Cajazeiras para as eleições de 2024.

O Ministério Público Eleitoral impugnou referido pedido de registro de candidatura no id. 12234722.

O Diretório Municipal do Partido Avante de Cajazeiras também apresentou impugnação ao registro de candidatura no id. 122367356.

O Partido Progressista -PP e a Coligação “para a mudança continuar” apresentaram impugnação ao registro de candidatura de Francisco Mendes Campos, pugnando liminarmente pelo indeferimento do registro em questão (id. 122367366)

A liminar foi indeferida no id. 122374841.

Francisco Mendes Campos apresentou contestação em id. 122434781 as impugnações ajuizadas.

Ao final, em sentença de id. 12249857, o Juízo da 68ª Zona Eleitoral julgou improcedente as impugnações protocoladas, deferindo o registro de candidatura de Francisco Mendes Campos, asseverando, em síntese, que a candidatura do Impugnado não configura violação ao disposto no art. 14, parágrafo 5º, da Constituição Federal, diante do rompimento da “sequência de mandatos no Executivo ao assumir um cargo legislativo”.

II – DAS RAZÕES RECURSAIS

A sentença a quo merece ser reformada para indeferir o registro de candidatura de Francisco Mendes Campos e se amoldar a regra constitucional prevista no art. 14, parágrafo 5º, da Constituição Federal e a consulta existente no Tribunal Superior Eleitoral sobre a matéria.

Como já explanado na Inicial, Francisco Mendes Campos foi prefeito constitucional do Município de São José de Piranhas nos seguintes períodos – 01/01/2017 até 31/12/2020 (1 mandato) e 01/01/2021 até 02/04/2022 (2 mandato) oportunidade que se desincompatibilizou do cargo de Prefeito para candidatar-se a Deputado Estadual na Assembleia Legislativa do Estado do Paraíba, tendo obtido êxito e exercido mencionada função até a presente data. E, atualmente, pugna sua candidatura como candidato a Prefeito Constitucional de Cajazeiras, Município limítrofe ao Município de São José de Piranhas. Portanto, tornando-se a presente candidatura do terceiro mandato do solicitante.

O art. 14, § 5º, da Constituição Federal preconiza que  “O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subsequente”.

Em sede de repercussão geral o Supremo Tribunal Federal fixou a tese nº 564 nos seguintes termos: O art. 14, § 5º, da Constituição deve ser interpretado no sentido de que a proibição da segunda reeleição é absoluta e torna inelegível para determinado cargo de Chefe do Poder Executivo o cidadão que já exerceu dois mandatos consecutivos (reeleito uma única vez) em cargo da mesma natureza, ainda que em ente da Federação diverso.

Saliente-se que a vedação a consecutivas reeleições visa atender ao princípio republicano, buscando a alternância do poder e vedação da perpetuação de uma mesma pessoa ou grupo no poder em cargos eletivos. Segue ementa do RE 637485 (Trânsito em Julgado). Aprovada em 01/08/2012, que fixou a TESE acima.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. REELEIÇÃO. PREFEITO. INTERPRETAÇÃO DO ART. 14, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO. MUDANÇA DA JURISPRUDÊNCIA EM MATÉRIA ELEITORAL. SEGURANÇA JURÍDICA. I. REELEIÇÃO. MUNICÍPIOS. INTERPRETAÇÃO DO ART. 14, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO. PREFEITO. PROIBIÇÃO DE TERCEIRA ELEIÇÃO EM CARGO DA MESMA NATUREZA, AINDA QUE EM MUNICÍPIO DIVERSO. O instituto da reeleição tem fundamento não somente no postulado da continuidade administrativa, mas também no princípio republicano, que impede a perpetuação de uma mesma pessoa ou grupo no poder. O princípio republicano condiciona a interpretação e a aplicação do próprio comando da norma constitucional, de modo que a reeleição é permitida por apenas uma única vez. Esse princípio impede a terceira eleição não apenas no mesmo município, mas em relação a qualquer outro município da federação. Entendimento contrário tornaria possível a figura do denominado “prefeito itinerante” ou do “prefeito profissional”, o que claramente é incompatível com esse princípio, que também traduz um postulado de temporariedade/alternância do exercício do poder. Portanto, ambos os princípios – continuidade administrativa e republicanismo – condicionam a interpretação e a aplicação teleológicas do art. 14, § 5º, da Constituição. O cidadão que exerce dois mandatos consecutivos como prefeito de determinado município fica inelegível para o cargo da mesma natureza em qualquer outro município da federação. […] Não se pode deixar de considerar o peculiar caráter normativo dos atos judiciais emanados do Tribunal Superior Eleitoral, que regem todo o processo eleitoral. Mudanças na jurisprudência eleitoral, portanto, têm efeitos normativos diretos sobre os pleitos eleitorais, com sérias repercussões sobre os direitos fundamentais dos cidadãos (eleitores e candidatos) e partidos políticos. No âmbito eleitoral, a segurança jurídica assume a sua face de princípio da confiança para proteger a estabilização das expectativas de todos aqueles que de alguma forma participam dos prélios eleitorais. A importância fundamental do princípio da segurança jurídica para o regular transcurso dos processos eleitorais está plasmada no princípio da anterioridade eleitoral positivado no art. 16 da Constituição. O Supremo Tribunal Federal fixou a interpretação desse artigo 16, entendendo-o como uma garantia constitucional (1) do devido processo legal eleitoral, (2) da igualdade de chances e (3) das minorias (RE 633.703). Em razão do caráter especialmente peculiar dos atos judiciais emanados do Tribunal Superior Eleitoral, os quais regem normativamente todo o processo eleitoral, é razoável concluir que a Constituição também alberga uma norma, ainda que implícita, que traduz o postulado da segurança jurídica como princípio da anterioridade ou anualidade em relação à alteração da jurisprudência do TSE. Assim, as decisões do Tribunal Superior Eleitoral que, no curso do pleito eleitoral (ou logo após o seu encerramento), impliquem mudança de jurisprudência (e dessa forma repercutam sobre a segurança jurídica), não têm aplicabilidade imediata ao caso concreto e somente terão eficácia sobre outros casos no pleito eleitoral posterior. III. REPERCUSSÃO GERAL. Reconhecida a repercussão geral das questões constitucionais atinentes à (1) elegibilidade para o cargo de Prefeito de cidadão que já exerceu dois mandatos consecutivos em cargo da mesma natureza em Município diverso (interpretação do art. 14, § 5º, da Constituição) e (2) retroatividade ou aplicabilidade imediata no curso do período eleitoral da decisão do Tribunal Superior Eleitoral que implica mudança de sua jurisprudência, de modo a permitir aos Tribunais a adoção dos procedimentos relacionados ao exercício de retratação ou declaração de inadmissibilidade dos recursos repetitivos, sempre que as decisões recorridas contrariarem ou se pautarem pela orientação ora firmada. IV. EFEITOS DO PROVIMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Recurso extraordinário provido para: (1) resolver o caso concreto no sentido de que a decisão do TSE no RESPE 41.980-06, apesar de ter entendido corretamente que é inelegível para o cargo de Prefeito o cidadão que exerceu por dois mandatos consecutivos cargo de mesma natureza em Município diverso, não pode incidir sobre o diploma regularmente concedido ao recorrente, vencedor das eleições de 2008 para Prefeito do Município de Valença-RJ; (2) deixar assentados, sob o regime da repercussão geral, os seguintes entendimentos: (2.1) o art. 14, § 5º, da Constituição, deve ser interpretado no sentido de que a proibição da segunda reeleição é absoluta e torna inelegível para determinado cargo de Chefe do Poder Executivo o cidadão que já exerceu dois mandatos consecutivos (reeleito uma única vez) em cargo da mesma natureza, ainda que em ente da federação diverso; (2.2) as decisões do Tribunal Superior Eleitoral que, no curso do pleito eleitoral ou logo após o seu encerramento, impliquem mudança de jurisprudência, não têm aplicabilidade imediata ao caso concreto e somente terão eficácia sobre outros casos no pleito eleitoral posterior.

No caso em questão, em nenhum momento ocorreu o rompimento dos exercícios de mandatos eletivos por parte do Impugnado. O afastamento do cargo de prefeito de São José de Piranhas em 2022 decorreu de desincompatibilização para fins de concorrer ao cargo de Deputado Estadual da Paraíba, estando o Impugnado no referido cargo até a presente data.

Apesar da sentença a quo indicar que as consultas formuladas ao Tribunal Superior Eleitoral não possuem efeito vinculante, é inegável que a natureza orientadora para as instâncias inferiores. A situação do Impugnado Francisco Mendes Campos foi objeto de consulta genérica perante o Tribunal Superior Eleitoral no ano de 2023.

A consulta n. 0600704-52.2023.6.00.0000 apresentada pela Deputada Federal Yandra Barreto Ferreira questionou o seguinte “ pessoa que, no curso do segundo mandato de prefeito(a), se desincompatibiliza para concorrer à eleição proporcional estadual ou federal (âmbito federativo superior) e se elege, rompendo completamente o vínculo jurídico o cargo de chefe do Executivo e com o município em que exerceu o cargo de prefeito(a) após tomar posse como deputado(a) estadual ou federal, pode, após 18 meses de exercício em caráter definitivo da função parlamentar, candidatar-se à chefia do Executivo em município diversamente daquele que já foi prefeito?” A resposta apresentada pelo Tribunal Superior Eleitoral em 18/06/2024 foi NEGATIVAMENTE.

Neste ponto, deve-se destacar parecer apresentado pelo Vice-Procurador-Geral Eleitoral na consulta acima indicada. Asseverou que a “situação hipotética apresentada narra exatamente o exercício sucessivo de três mandatos em sequência, ainda que o segundo deles tenha sido interrompido para exercício de cargo diverso”, indicando a impossibilidade de “acolher a tese da consulente”, mesmo “quando não exerceu a plenitude de dois mandatos consecutivos”, vez que a assunção ao cargo, mesmo que temporária, “produz o efeito de exercício de mandato”.

O Impugnado assumiu o segundo mandato no cargo de Prefeito de São José de Piranhas em 2021, cargo que estaria ocupando até hoje, caso não tivesse se desincompatibilizado para concorrer as eleições gerais em 2022, ao cargo de Deputado de Estadual. A mudança do domicílio eleitoral de Francisco Mendes Campos para fins de concorrer ao cargo de Chefe do Poder Executivo Municipal de Cajazeiras configura hipótese de “prefeito itinerante”, conduta esta vedada no nosso Ordenamento.  

Assim, diante da clara situação de inelegibilidade constitucional, por violação ao disposto no art. 14, parágrafo 5º, da Constituição Federal, tem-se por necessário a rejeição da candidatura de Francisco Mendes Campos.

III – DOS PEDIDOS

Diante do exposto, requer o Ministério Público Eleitoral o CONHECIMENTO do presente Recurso Eleitoral e a PROCEDÊNCIA deste para fins de rejeitar o pedido de candidatura de Francisco Mendes Campos para o Cargo de Prefeito do Município de Cajazeiras/PB.



Sarah Araújo Viana de Lucena

Promotora Eleitoral