A professora universitária
Maria Luiza Pereira Feitosa, que junto com os professores José Irivaldo Alves
de Oliveira e Aendria de Souza do Carmo, é autora de um estudo acadêmico que
mostra as armadilhas inconstitucionais sobre o novo marco regulatório e as
implicações e impactos deste novo modelo proposto pelo Governo Federal em
serviços tão essenciais como água e esgotamento sanitário, fez um resumo do
conteúdo do documento e abriu as falas do debate. “Fomos estudar os meandros
desta questão e produzimos um documento de 40 páginas que fosse convincente do
ponto de vista científico. Nele, mostramos os problemas que essa questão traz e
algumas maneiras de como enfrentá-los”, disse ela.
Segundo a professora, o
problema é que essa Lei, publicada em julho de 2020, no contexto da pandemia,
não revogou a Lei 11.445/2007, no entanto, revogou parte dela estabelecendo um
novo marco legal para a gestão de saneamento básico no Brasil, que abrange
quatro vertentes: abastecimento de água potável, esgotamento sanitário,
drenagem urbana e gestão de resíduos sólidos. “Não estamos falando somente de
água e esgoto. A grande mudança, de acordo com o estudo, é que o novo marco
abre caminho para a privatização do negócio do saneamento igualando-o, em
termos de rentabilidade, ao setor de telefonia, energia e outros”, explicou
ela, lembrando que a Lei altera profundamente as competências da Agência
Nacional de Água, que agora passa a ser Agência Nacional de Água e Saneamento
universalizando os serviços e impondo aos estados um formato de regionalização,
seja por iniciativa própria ou por imposição da União.
A professora levantou a
questão da necessidade da Paraíba aprofundar esse debate e não votar a matéria
a toque de caixa, sem conhecer as repercussões desta mudança proposta. “Os
senhores deputados conhecem as diversas modalidades da prestação regionalizada
de serviços? Quais as diferenças entre elas? Sabem quais são os consórcios
públicos ou os convênios de cooperação dos quais a Paraíba faz parte hoje?”,
questionou a professora. Ela também lembrou que a Lei elimina o subsídio
cruzado que incorpora o princípio da solidariedade entre aqueles municípios que
são superavitários e aqueles que são deficitários. “Isso, fatalmente, resultará
num aumento de tarifa para as comunidades mais carentes e gera uma incerteza
sobre a tarifa social que não vai mais ser disponibilizada”, afirmou ela,
lembrando que esse modelo imposto pela União aos Estados é prejudicial e também
inconstitucional porque quebra o pacto federativo.
O modelo que deve ser
proposto pela Paraíba, através de Lei Complementar, segundo o estudo feito
pelos professores da UFPB e UFCG, adota um modelo de divisão em quatro blocos,
sendo um no litoral com polo em João Pessoa, outro na Borborema, com polo em Campina
Grande, e outros dois polos que englobam o restante do Estado. “A pergunta que
fazemos é por que a Paraíba adota um modelo padrão que não foi elaborado por
aqui, não foi debatido com a comunidade local, não foi discutido com o Poder
Legislativo, com os municípios, mas elaborado por uma empresa de São Paulo que
adota o mesmo projeto para quase todos os estados da Federação? Por que a
Paraíba quer adotar esse modelo pré-pronto”? Questionou a professora Maria
Luiza.
O professor do Curso de
Gestão Pública da UFCG, José Irivaldo Alves de Oliveira, lembrou que a
regionalização, por si só não é ruim, mas que é preciso observar detalhes deste
processo porque a regulação como está sendo proposta é frágil. João Vicente
Machado Sobrinho, engenheiro e representante do Sindiágua, que trabalha há mais
de 40 anos no setor, lembrou das deficiências dos municípios e dos processos
licitatórios que podem prejudicar as localidades se não interessar do ponto de
vista lucrativo. “Essa discussão não se restringe aos muros da Cagepa, vai
muito mais além”, disse ele.
O presidente do Sindiágua,
José Reno de Sousa, elogiou a iniciativa da ALPB de discutir um assunto tão
importante e externou sua preocupação não apenas com o provável aumento da
tarifa da água, mas com a disponibilidade do bem que poderá faltar em localidades
que não serão prioritárias para as concessionárias. O vice-presidente do
Sindiágua, Geraldo Quirino, lembrou que esse debate da privatização dos
recursos hídricos começou logo após a posse de Michel Temer e que é preciso
mudar esse modelo que está sendo proposto porque ele não será bom para a
Paraíba. Wilton Maia, do Sindicato dos
Urbanitários, seguiu o mesmo raciocínio dos dirigentes do Sindiágua,
acrescentando que se permanecer o modelo de divisão da Paraíba em quatro
regiões, apenas uma delas será superavitária. “E como ficarão as outras três
regiões que serão deficitárias”, disse ele, lembrando que além da questão
técnica, essa decisão da privatização da água também é política.
Guilherme Mateus,
representante do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas da Paraíba-
STIUPB, parabenizou a iniciativa do deputado Jeová Campos e lembrou do perigo
de se entregar um serviço tão essencial nas mãos da iniciativa privada. A
Cagepa não mandou representante para o debate e alegou que os técnicos da empresa
estavam participando de debate semelhante, com interlocutores nacionais no
momento do evento da ALPB.
Posição dos parlamentares
que participaram do debate
A deputada Cida Ramos
lembrou que esse projeto não se trata de uma mera privatização da Cagepa, como
já aconteceu em vários setores no país, mas de um bem comum que é essencial à
vida e que, por isso, é preciso aprofundar muito esse debate até que a matéria
seja aprovada. “O Governo do Estado ainda não nos apresentou nenhum dado sobre
essa temática para que a gente realize uma discussão qualificada. A Paraíba tem
500 mil pessoas que vivem em situação de vulnerabilidade. E como ficam essas
pessoas quando a água for privatizada? A água é um direito humano e nós não
permitiremos que o povo da Paraíba fique à margem deste debate”, reiterou a
parlamentar.
O deputado Anísio Maia
reiterou que essa proposta de privatização, que agora chega aos recursos
hídricos e saneamento básico, é uma traição a soberania nacional e ao povo
brasileiro, como já aconteceu em outros setores. “Só nos resta às ruas, o
levante popular para lutar e resistir a essa política de privatização de
serviços essenciais que torna o que já é ruim, muito pior e mais caro. Isso é
uma traição ao povo brasileiro e nós precisamos resistir a tudo isso,
divulgando essa ‘tramoia’ o mais que a gente possa”, disse ele.
A deputada Estela Bezerra
reiterou a necessidade deste tema ser mais aprofundado e reafirmou que, além do
aprofundamento dos debates, é preciso que a Paraíba encontre um projeto que não
inviabilize o acesso a segurança hídrica dos paraibanos. “Não podemos nos
associar ao projeto que propõe um completo desmonte da Cagepa proposto pelo
governo federal. Devemos fazer um esforço para fazer emendas ao projeto que
chegará a ALPB para que a Paraíba não aprove uma matéria nociva aos
paraibanos”, disse ela.
Já o deputado Jutay Meneses
lembrou de sua preocupação com o encaminhamento desta questão tão importante,
levantando também a questão de como ficará a qualidade da água e a
administração deste recurso neste novo modelo de gestão. O deputado Moacir
Rodrigues, por sua vez, chamou atenção para a gravidade da ALPB aprovar uma
matéria desta importância, sem o devido debate, e disse que se isso não for
levado muito a sério a “Paraíba vai caminhar para uma sinuca de bico”. O
deputado Janduhy Carneiro externou sua preocupação com essa temática e disse
que há necessidade de realização de um debate mais amplo, através de uma
audiência pública, para debater com mais profundidade essa questão antes que o
Projeto de Lei, que aborda essa temática, chegue à ALPB para ser apreciado e
votado.
O vereador pessoense, Marcos
Henriques (PT), lembrou que essa luta é de todos os cidadãos e que o processo
de privatização de serviços essenciais precisa da resistência da população.
“Precisamos nos unir contra tudo isso. Essa política hídrica não contempla a
sociedade, pois é uma política de estado mínimo do atual governo federal, que
estratifica a população e entrega ao capital especulativo e a iniciativa
privada serviços essenciais. A Paraíba não pode aceitar esse marco regulatório
de maneira açodada. É preciso aprofundar esse debate e lutar contra essa
política excludente”, disse ele.
Assessoria de Comunicação