domingo, 24 de julho de 2011

Memórias de um cajazeirense; “O vaso de flores”

Pelos idos da década de 1960, papai, aconselhado por mamãe, resolve me dar um “emprego” nos Armazéns Paulista que ficava logo no começo da Rua Epifânio Sobreira, um edifício de quatro pisos que, na época, rivaliza com a velha rodoviária Antonio Ferreira, como os dois mais altos prédios de Cajazeiras. O gerente era o finado Antonio Dunga e eu fui nomeado “sub-gerente”, todavia a minha maior responsabilidade era recolher o livro de ponto às oito horas em ponto para que funcionários retardados tivesse o dia descontado.

Ganhava Cr$ 1 (um cruzeiro)! Não era pouco para uma criança e assim mesmo com os gastos de sorvetes e cinema (parque e circo eu não pagava, pois como filho do prefeito tinha acesso gratuito) ainda me sobrava dinheiro.

Chega o dia das mães, com dinheiro poderia me dar o luxo de comprar o presente sem precisar de socorro financeiro de papai. Tem orgulho maior para uma criança do que comprar um presente para sua  mãe neste dia?


Pensei com os meus botões e nada me vinha à mente, chegou sábado e não achava o presente ideal. Sábado dia de feira na cidade e, pensei, lá, certamente, encontrarei o presente. Rodei na feira e não achava nada... Panelas e potes de barro, brinquedos rústicos, literatura de cordel para todos os gostos, roupas, quase que só de chita e cáqui, chapéu de palha, e mil coisas mais, mas eu não achava o presente. Quando já desesperançado em frente á sapataria de Manoel Caiçara na Rua Juvêncio Carneiro, logo ao entrar na rua pela Praça Coração de Jesus, encontro uma velha tão gorda e baixa que mais parecia um metro cúbico de carne vendendo flores. Mas que flores? Uma lata de tinta usada revestida de papel celofane cheia de areia com flores e seus talos feitos de arame, também ambos revestidos de papel celofane.


O presente não era tão feio. Tornou-se. Na alegria de ter encontrado o presente, sai correndo para casa. Menino não anda, corre. Quando eu dobro o canto da Travessa Santa Teresinha que bem no meio, em frente à livraria do finado Horácio Alves, tinha uma fossa grande, até construída na administração municipal de papai, que ficou mais alta que o calçamento, propiciando aos mais apressados a oportunidade de tropeçar. E foi o que aconteceu comigo. Fui para um lado e a lata, oppss, o vaso de flores para outro deixando-o com várias avarias. Ah, isso não é problema, joguei a terra que foi esparramada pelo chão de volta à lata, oppss, o vaso de flores, enfiei de volta os arames, ooppss, os ramos de flores no vaso e voltei a correr para casa, era a casa nova da  Rua Victor Jurema, uma casa grande, a maior e a melhor que morei em Cajazeiras, e escondi o presente na garagem.


Dia seguinte, domingo, Dia das Mães, vou buscá-lo e entro solenemente em casa para entregá-lo à mamãe, a emoção dela foi grande, principalmente quando soube que o presente tinha sido comprado com economias do meu trabalho. Mamãe nem viu o estado deteriorado pelo acidente de percurso, ou melhor, não deixou transparecer.

Empolgado, fiz uma só exigência: “Mamãe queria lhe pedir que guardasse o presente em cima da geladeira” e assim ela fez.

Aí, está o bom da história, as visitas que apareciam lá por casa e vendo a casa toda arrumada e chique, estranhava aquela monstrengo que destoava em cima da geladeira e perguntava: “Teresa, o que aquela presepada em cima da geladeira?”. Mamãe, afobada, fazia sinal de silêncio e cochichava: “Foi o presente do dias das mães do meu filho!

E lá permaneceu por bom tempo, assustando as visitas.
Por Claudiomar Matias Rolim

                                  "Minhas recordações de Cajazeiras"‏